sexta-feira, 29 de maio de 2009

Os Meus Poetas


Gosto de poesia. Daquela cujas palavras deixam perfume nas nossas mãos e, sobretudo, na nossa alma. Poesia que se entenda como as coisas simples da vida. Sem grandes adjectivos e substantivos “eruditíssimos”. Não daquela que até espremida, como um limão, não deita nada a não ser, talvez, uma gota amarga do tempo que se perdeu ao lê-la. Não gosto da poesia carregada com um bom sobretudo de marca mas que ao tirá-lo deixa à mostra uma nudez inglória ou então uma roupa de feira de muito mau gosto. Não gosto de um desfile de palavras caras, que ficam bem, a mostrar uma cultura com pouca arte. Lembra-me os quadros que não dizem ou não representam nada mas são bons pelo nome de quem os pintou. E os livros? Alguns enfadonhos, maçudos, cansativos, mas é de bom tom dizer que se leu este ou aquele autor… Gosto de poesia que fale de sentimentos, de amor, de abraços e beijos… essas lamechices que tão bem cantou Florbela Espanca. Gosto de poesia embora a minha área de expressão literária preferencial seja, sem dúvida, a prosa. Por vezes peço desculpa aos verdadeiros poetas e “alinhavo” uns versos, simples, como eu.
Sigo o blogue Moçambicanto onde há uma verdadeira montra de poetas da minha terra. Entre eles está Jorge Viegas, meu conterrâneo, amigo e antigo colega. Juntos contracenamos na peça de teatro “A Muralha” de Calvo Sotelo, juntos trabalhamos como membros activos no Centro juvenil de Quelimane, juntos dissemos poesia. O seu primeiro livro, publicado ainda em Quelimane, foi um sucesso! Os poemas que hoje escolhi são de um outro livro, editado já em Portugal, intitulado “Novelo de Chamas”.

Um beijo para ti, Jorge!


Os Que Temem

Os que temem as palavras e as policiam
Devem saber que as máscaras cairão,
Sejam elas de lata ou papelão
ou de engodos fáceis que aliciam.

Os que temem as palavras e as esvaziam
Do seu conteúdo verdadeiro e são
E nas verdades suas se extasiam,
Usem as máscaras que usarem, são

O brilho de astros que há muito esfriam,
E o espaço morto de uma revolução.



Ao Escreveres Um Poema

Ao escreveres um poema
Não dês demasiada importância às palavras.
No poema, as palavras
Não existem verdadeiramente,
Não têm existência de facto.
No poema, as palavras
Não têm consistência.
Nem são sensíveis ao tacto.
No poema, as palavras serão simplesmente
As imagens que habitam
O mais profundo do teu ser.
E o teu poema violará o espaço aéreo
No bico das pombas
E será levado
Na franja marítima das ondas.


quarta-feira, 27 de maio de 2009

O Meu Jardim


Se há alguns anos atrás me dissessem que jardinar seria uma das minhas paixões, não acreditaria! Ainda bem que mudamos. É no meu jardim que eu reúno momentos tão dispersos da minha vida. Gosto dos apelos no seu silêncio. Enquanto corto a sebe a minha alma está aberta a todas as emoções.
Está um dia de sol aberto, maravilhoso. Todos se queixam: está calor! Eu respiro feliz: que delícia! Gosto do sol a morder-me na pele. As cores espalhadas pelo verde extasiam-me. Os aromas estonteiam-me e trazem-me recordações. A chilreada de centenas de passarinhos, que este ano invadiram todo o espaço exterior, é delícia para os meus ouvidos. Melhor que as partituras dos mais famosos, pelo menos mais natural.
Tesourada daqui, tesourada dali e os pensamentos são como os ventos, chegam à hora menos pensada. Como fugir deles? Não sei como fechá-los… Há um perfume de rosas (postas por ti) que reverdece as lembranças. Nesse dia tinhas aparado toda a sebe do jardim, as heras dos muros do quintal e do pátio. Foi um trabalho exaustivo, parecia-te que o mundo acabaria nesse dia e era preciso deixar tudo em ordem. Não acabou mas aproximava-se a curva da estrada. Atrás de ti ia juntando todos os ramos para ser depois mais fácil apanhá-los. Do fundo do quintal disseste-me: “Belo trabalho, miúda, belo trabalho”.
À noite, um vento gélido varreu as estrelas do céu e entrou-nos pela casa dentro. Começava a tua via-sacra. E eu, tal como Maria, acompanhava-te numa angústia, sem saber o que fazer. Mais uma vez tive a noção que a vida é a sala de espera para a eternidade. Escutara o teu canto de cisne, assistira ao teu desafio redobrado à volta da sebe, como andorinha estonteada à procura de fazer o seu ninho… Tudo eram sinais de esperança! No entanto, o teu passo acertava-se já com outros passos de um outro caminho. Partiste daí a um mês. Nem mais. Nem menos. Sempre foste rigoroso em tudo e por último não podias falhar.
É no jardim que eu sinto mais a tua presença e talvez por isso goste tanto dele e o cuide com tanto amor. Mas não há só lágrimas por cima das tuas rosas… Oiço rumores de beijos, risadas cúmplices de quem, apesar dos anos, ainda sabia namorar. A alegria de saber que no meu coração, e no teu, existia um lugar especial para nós dois.
Hoje, sem estares comigo, estás presente. Vejo-te nas flores que me rodeiam. A distância? Ela não consegue destruir aquele fio invisível que nos prende. Continuas ali, no nosso jardim… Apenas agora, quem poda a sebe sou eu.
De um lugar para onde todos nos encaminhamos, vais fiscalizando o meu trabalho e sinto no coração pequenas mensagens, como se, de facto, o nosso diálogo não tivesse ainda terminado. E o coração não me engana. Não sei dimensioná-lo, não sei descrevê-lo… mas esse lugar maravilhoso existe mesmo.
Gosto do meu jardim: nele colho sorrisos com que enfeito os meus lábios, recolho gotas de beijos e conheço novamente o gosto da felicidade. Leio e releio os livros que mais gosto. Estudo, pesquiso e, principalmente, reflicto… A Vida! Mas há mais vida? Então não é o passado todo e este presente? Não. Falta o amanhã. Nem que seja apenas um dia, mas há-de ser feliz, pleno e sem lamúrias.
Um dia, uma amiga que veio passar uns dias comigo disse-me: “Quem tem um jardim como o teu não tem o direito de estar triste”. E porque haveria eu de estar?

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Os Nossos Domingos (IV)


Porque hoje é domingo vamos passar o dia na FAE!
Foi inaugurada no dia 15 de Agosto de 1969 com pompa e circunstância. A Zambézia inteira derreteu-se de orgulho e vaidade com a sua primeira Feira de Actividades Económicas. Era a montra possível e exaustiva de todo o distrito. De todo o país, da vizinha África do Sul e não só, chegavam visitantes ilustres e desconhecidos. A cidade parecia um intenso formigueiro com pensões e hotéis esgotadíssimos. O Governador Geral de Moçambique, Dr. Baltasar Rebello de Sousa, presidiu à sua inauguração, percorrendo depois toda a Feira, visitando em pormenor cada um dos mais de vinte pavilhões do certame. A FAE, para além do interesse mostruário que muito bem representou, trouxe também uma promoção turística às nossas belíssimas praias com relevo para a de Zalala que, na altura, começava a ter um desenvolvimento no plano de valorização.
A FAE só por si representou uma enorme propaganda, com benefícios para toda a Zambézia, num empreendimento audaz e grandioso. No dia da sua inauguração e nos fins de semana posteriores foi difícil arranjar espaço para tantas viaturas. Estacionava-se até ao velho aeroporto. Entrava-se pela estrada privada do Dúlio Ribeiro. Fazia-se cordão pelo bairro dos pescadores e ruas adjacentes. Só faltava mesmo estacionar em cima de uma palmeira… Era a loucura total! As noites também eram convidativas. Para além das visitas aos pavilhões, que demoravam horas, de alguns simpáticos bares e restaurantes, a boîte UAIA-UAIA funcionava permanentemente com um conjunto privativo e shows de bom cartaz. Berta Laurentino, vedeta do RCM, foi o primeiro chamariz bem acolhido pelos clientes da noite. Seguiram-se as Irmãs Muge e Zito que vieram da capital propositadamente para actuarem na boîte. Durante a semana a prata da casa fazia a festa: Emília Duarte, Tété, Firmino Teixeira, Luís Guimarães e o Duo Pérolas, acompanhados pelo conjunto residente The Blue Twisters. Também outros programas lúdicos e desportivos seguiam a par e passo de toda a vida da FAE, como a exposição da escultora Arminda Oliveira, concursos de dança e fotografia, o torneio de tiro aos pratos, a presença do Circo Mariano que constituiu outra oportuna atracção e ainda o pequeno comboio infantil que, carregado de crianças, ziguezagueava pelos arruamentos da Feira. O programa desportivo encerrou com um importante Torneio de Ténis onde participaram os maiores valores da modalidade em Moçambique: António Trindade, Victor Carvalho e Marina Pimentel de Lourenço Marques; Dino Zolezzi, Ramiro Rodrigues e Maria José Silva da Beira; Manuel Nascimento e José Maio de Quelimane e três dos melhores tenistas do Malawi.
Quando o simpático porteiro da FAE, José Macedo Sequeira, fechou as portas do certame, já os seus organizadores pensavam com certeza, e em grande, a Feira das Actividades Económicas da Zambézia - 1970! E foi mesmo!

A seguir à Fonte Luminosa, que dava as boas vindas aos visitantes, ficava um espaço colorido emoldurado pelo verde das palmeiras e com que, gulosamente, os nossos olhos se deleitavam.


1-O pavilhão da Kruger, moderno na sua concepção, situava-se quase logo à entrada do recinto.


2-O pavilhão das Comunicações, com um sol, símbolo muito significativo do seu conteúdo. As assistentes do mesmo: Graça Pereira e Regina.



3- Visitando o pavilhão da Câmara Municipal, interessante no historial da cidade e com recantos agradáveis para receber as suas “visitas”.


4- Junto ao “meu” pavilhão, com as palmeiras sempre por fundo. Por todo o lado, para além das flores, existiam pequenos apontamentos arquitectónicos que tornavam o visual da Feira muito arrojado e bonito de se ver.


5- O Pavilhão da Kodam; para mim, dos mais bonitos e imaginativos.


6-Marinheiras em terra… Outro apontamento com algum significado que agora já não me recordo. Por detrás o pavilhão maravilhoso, imitando uma grande palhota, da Boîte UAIA-UAIA!


7-Em frente do pavilhão do RCM - Emissor Regional da Zambézia.

E muitos outros pavilhões ficam por mostrar, entre eles o que alcançou o 1º lugar no concurso. Fica para uma segunda parte deste tema: FAE!

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Schwarzenegger do Chuabo


As palavras e as recordações são como as cerejas que hoje comi ao jantar: vêm umas atrás das outras. E é de noite que a ave da lembrança vem fazer ninho no meu coração e me leva com as suas asas, no meio deste silêncio, a outras paragens. Não quero deformar imagens, acontecimentos e tantos episódios que aqui relato. Tento ser fiel e, para isso, subo ao terraço da minha alma e olho o infinito à procura, talvez, de mim própria. E espero. Noites longas, tantas… E com o vento suave da memória chegam as peças do cenário que eu levanto como se fosse um baralho de cartas.
Tínhamos ido, o grupo habitual, aos arredores de Coalane distribuir as senhas para as refeições da semana, pão e alguma roupa aos carenciados que estavam a nosso cargo. Eu era a única que tinha carro, bem pequenino por sinal: um Fiat 500, vermelhinho como as ditas cerejas. Nessa altura, havia um agente da polícia de viação que andava numa moto potente que era o Schwarzenegger lá do sítio. Quase dois metros de altura, largura de um bloco de cimento e um rosto patibular. Todos tinham receio porque o senhor não se fazia rogado para passar multas aos mais incautos e desprevenidos. Diziam que por detrás daquela máscara não havia um coração. Junto à estação de serviço que ficava do lado direito quando se entrava na cidade (uma das últimas a ser construída) o agente mandou-me parar. Ali perto existiam meia dúzia de palmeiras que os corvos, não sei porquê, utilizavam como ninhos. Grasnavam todo o dia que era uma perdição. Ora nesse momento o coro silenciou-se, talvez atento ao que se iria passar.
- Encoste aí o carro menina e mostre-me os seus documentos.
Fazíamos companhia aos corvos num silêncio de morte. Abriu-me a porta do carro e mandou-me sair. Como o gigante olhando Golias perguntou-me secamente:
- Conhece a lotação da sua viatura?
- Claro, senhor Guarda, são 2 lugares!
- Ah, então não é por ignorância!
Afoitamente respondi-lhe:
- Não, não, é por necessidade.
As minhas amigas quase sumiam por debaixo dos pequenos bancos. Rodopiou os calcanhares e direito que nem um fuso dirigiu-se ao outro lado; abrindo também a porta executou o mesmo cerimonial:
- Façam o favor de sair uma a uma.
Era escusado dizê-lo, ali entrava-se de calçadeira e saía-se de saca-rolhas. Como quem conta limões qual vendedor do mercado que até ficava ali perto, começou:
- Uma, duas, três, quatro, cinco e seis.
E voltando-se para mim perguntou ainda mais exaltado:
- Que me diz a isto menina?
- Que somos elegantes. - respondi prontamente.
Alguém abafou uma gargalhada.
- Lamento mas vou passar-lhe uma multa!
E punha o livro das famigeradas multas em cimo do capot do meu “Boguinhas”.
- Como entender senhor guarda, na certeza porém que amanhã voltaremos a fazer o mesmo, a não ser que o senhor faça a amabilidade de nos ajudar com a sua mota a levar material para sete famílias a quem damos assistência. A Luísa dizia atrás de mim:
- Vais ser presa!
Tal como o primeiro sucesso não significa vitória, também o primeiro fracasso não significa derrota. A serenidade é a força dos fortes e a iniciativa faz parte do discernimento. Ele fechou o bloco devagar e indagou mais suavemente:
- Vocês fazem parte de algum grupo ou movimento?
Voltou o coro dos corvos. Bem ensaiadinhas numa só voz:
- Somos do Centro Juvenil de Quelimane!
- Mas então a Igreja ou o Padre não vos faculta um transporte? - Rimo-nos!
- Conhece o Padre Bernardino, aquele que calcorreia a cidade numa velha bicicleta? Pois é esse o responsável pelo Movimento. Está a ver sete moças em cima daquela bicicleta?
Finalmente humanizava-se:
- Claro que não e o que fazem é muito meritório…
Ficou algum tempo calado; depois lá terá pensado que estava a perder autoridade às mãos de umas miúdas e recuou na sua fraternidade:
- Vamos fazer assim, a menina leva agora três das suas amigas e depois vem buscar as outras três. Eu fico aqui com elas.
Não nos podíamos queixar… pelo menos o iceberg mostrara ter um pouco de coração e não nos penalizara. Tínhamos tido sorte! Quando regressei para levar as outras três, recomendou ainda:
- Façam por não se encontrarem comigo…
Ao que eu lhe respondi:
- Faça o senhor também por não nos ver, o que será fácil, o meu carro é o único Fiat vermelhinho que existe na cidade!
Riu-se:
- Já tinha notado!
E lá foi o Schwarzenegger à procura não de uma mas de duas multas, para compensar o momento em que fraquejou.
Nós ficamos a pensar que o Guarda não era tão mau como se constava; afinal, quem vê caras não vê corações, mesmo os que, a princípio, parecem nem existir!


quarta-feira, 20 de maio de 2009

A Casa


Fica do outro lado do mundo e do tempo também. Rodeada de buganvílias vermelhas que já não existem e debruçada sobre velhas acácias que mal floriam nos diziam que estava próximo o Natal. Chamavam-lhe o “navio” por causa da configuração redonda da sua varanda. Nela vivi quase uma vida. Continua a ser para mim “a Casa”! Posso ter esquecido algumas lembranças mas, da Casa, jamais. Elas persistem como correntes de afecto que me recordam cada cantinho com a sua história, ora entrançada em gargalhadas, ora mergulhada em lágrimas de tantas despedidas. Há cheiros fortes a lembrar doçura e rumores suaves da brisa vinda do rio que dançavam no canto da nossa varanda nas noites mais quentes do ano. Do jardim chega-nos o aroma quase sensual da “rainha da noite”, principalmente quando beijada pelo luar. A minha varanda é como o cais de muitas chegadas e partidas. Ali venho saudar quem passa e quem chega. Ali venho dizer adeus com sorrisos molhados a amigos que nunca mais voltei a ver. A Casa guarda segredos e tesouros de conversas sem fim. Oiço o ruído alegre da festa dos meus quinze anos, o meu desabrochar para o mundo dos adultos. A experiência do primeiro batom e os centímetros a mais dos primeiros sapatos de salto alto. Há um tropel de sonhos novos, desconhecidos, dentro do meu peito. Mas há também uma tristeza de ter crescido num sentimento de quem ainda está fora do compasso. Talvez as cortinas do meu quarto em shantung lavrado, com imagens de fadas e duendes, já não fiquem bem…
Lembro também a angústia daquelas noites apertando-me o coração, olhando com desconfiança as manhãs que tardavam em chegar. E o médico a dizer-me: “prepare-se e ajude a sua mãe. O seu pai tem pouco tempo de vida”. Era o meu primeiro contacto com a morte. Pensara sempre que seriam necessárias muitas delongas para ela chegar. Puro engano! É muito mas mesmo muito mais simples. Ao lado festejava-se o Reveillon no Sporting e eu espantava-me como é que alguém teria vontade de rir e dançar. Entenderia mais tarde que o mundo gira a várias velocidades e nem sempre com a mesma justiça. É assim que nós crescemos e avançamos na vida. O coração da Casa continua a bater dentro do meu peito. E sou outra vez criança e faço o meu presépio e não esqueço a cartinha ao Menino Jesus. E sou outra vez adolescente e tenho os meus cadernos cheios de pequenos corações. E já sou mulher e espero uma aliança de ouro na minha mão ao som da marcha nupcial.
A Casa será sempre “a minha Casa” e ponto final!


terça-feira, 19 de maio de 2009

Bailes De Finalistas (I)


Éramos então finalistas do CNA e o mundo profissional e universitário abria-se à nossa frente! Estávamos repletos de sonhos de muitas cores, de todos os tamanhos e feitios e tínhamos 18 anos! O nosso baile foi na Liga com as meninas todas vestidas de branco, com o emblema do colégio ao peito e os rapazes um pouco menos formais mas igualmente com o emblema do colégio no braço do casaco. Foram horas e horas de rodopio num “sonho de uma noite de verão”. Como esquecer?


Da esquerda para a direita e na fila de trás: João Manuel, Anselmo Alves, Carlos Alberto, Roberts, António Carlos, Nuno, Laginha, Valdemiro, Babu.
Fila do meio: Raul Vieira, Canas, Judite, René, Graça Serrano, Ana Felicidade, Graça Pereira, Ana Maria Gomes Pedro, Teresa Salgado Freire, Saroj, Jesus Belo, Barcelos.
De joelhos: Sérgio Duarte, Dias, Catatau, Rui Velasco, António Galvão, Orlando, Luis Pedro Sá Mello, Mário Almeida.


Um grupo de Finalistas da Escola Comercial e Industrial D. Francisco Barreto:
De pé: Sérgio Ó da Silva, Catalão, Locas (a madrinha) Zeca Nunes, Luís Ogando.
De joelhos: Itas e Martins.
O evento, teve lugar na própria Escola Técnica (1962/63).

segunda-feira, 18 de maio de 2009

A Sombra das Recordações


Hoje, o sol voltou a fugir. Tem feito no céu, por estes dias, um ballet de Primavera. O verde do meu quintal está molhado e as árvores da minha rua despejam grossas lágrimas pelo asfalto. Nada convidativo para sair. Resolvi continuar as minhas arrumações do passado. Alguma vez estarão arrumadas? Não creio. Peguei numa caixa grande de cartão onde há tempos enfiei tudo o que um dia me interessaria ver: cartas, bilhetinhos, postais, recortes de tudo e mais alguma coisa e fotos ainda não organizadas. É que o tempo não dá para tudo! Chamo-lhe a caixa da ternura. Tem dentro sorrisos, fios de sol, venturas, lágrimas, beijos e saudades. Não é uma caixa qualquer. Tem margaridas pintadas por fora que colheram noutro tempo todo o ouro do sol. Pego primeiro nas cartas. Há gente que já partiu mas continua a falar-me de tanta coisa que, ainda hoje, preciso dessas palavras para caminhar. Não é uma questão de insegurança ou de solidão. O que dizem é tudo tão actual que pareceria um conselho para cada dia da minha vida de hoje. A amizade não tem um tempo, não cheira a bafio e não fica nunca fora de moda. Eis a primeira carta: “Numa palavra amiga se encontra, tantas vezes, o tal atalho na busca do ideal…” Sempre guardei as tuas cartas por mil razões. A nossa amizade já vem da geração dos nossos pais, somos mulheres fortes, de fé, mas tantas vezes aos pés de uma cruz… Embrulhamos a nossa dor num papel chamado alegria e dos nossos trapos ainda conseguimos fazer mantas para tapar o frio dos outros. Ainda bem que continuas no meu caminho. E esta? Não é uma letra familiar. Uma folha de bom papel, num tom cinzento claro: ”Nós assustamo-nos com as dificuldades mas, depois, verificamos que as coisas se resolveram melhor do que temíamos. Claro que em nós tudo se interliga: a fé com a saúde, a disposição com a meteorologia e a sensibilidade com a inteligência”. Tem vinte anos esta carta e não me lembro nada da pessoa que a escreveu. Contudo, sei que nessa altura passava por uma depressão pela morte da minha mãe. Outra: “A felicidade está dentro de nós. Somos muito mais importantes do que aquilo que nos acontece”. Esta é muito, mas mesmo muito mais antiga. De alguém que me conhece desde a minha juventude e que me viu crescer por dentro e por fora. E o que é isto? Papel grosseiro, quase de embrulho… São umas quantas! ”Comadra: Aqui estamos a passar bons, não há nada do mal. Sua afilhada continua com a 4ª classe. Este ano era para passar para a 5ª mas não passou. Peço à comadra para comprar um livro pequeno, dicionário, para ela. Chuva aqui não pára desde o dia 24 de Dezembro até hoje, não tem um dia de não chuver. No ano passado passei todo de miséria visto andei a receber sempre falecimentos das famílias… Cumprimentos senhora grande. Um forte abraço sua afilhada e outro sempre seu compadre, Zacarias”. Penso no meu compadre negro, tão educado, sempre tão honesto… Recordo o dia em que ele me foi convidar para ser madrinha da pequena Esperança. Estava numa aflição e eu não entendia o motivo da tanta atrapalhação:
- Vá Zacarias, há algum problema?
- É que padrinho vai ser Zé Manel.
Entendi logo o dilema. O Zé Manuel era também negro e motorista dos serviços.
- E daí? Acho muito bem a escolha. Ele é seu amigo, seu vizinho e bom homem, não podia ter escolhido melhor.
Respirou fundo como se um peso tivesse saído de cima dele e voltasse à vida. Mas… ainda havia um mas:
- É que, como o baptizado é na Igreja da Sagrada família o almoço vai ser na minha palhota.
- Ah, na sua casa, tudo bem.
Não, ainda não estava tudo bem. O Zacarias torcia as mãos e pensava que a menina não percebia nada da vida nos arredores mais necessitados da cidade. Como se enganava! Foram cinco anos intensivos a trabalhar em grupos nos aldeamentos indígenas. Decidi abrir o jogo:
- Zacarias, vamos fazer assim. O vestido da minha afilhada, as despesas do baptizado e o Bolo mais o champanhe, pago eu. Amanhã vou a sua casa para vermos como organizar a festa; e diga ao Zé Manel para aparecer também.
Nem por nada queria deixar o padrinho de fora de toda esta movimentação. O suspiro foi mais forte ainda, finalmente a menina entendera tudo. Ainda que por caminhos diferentes, procuramos todos o mesmo: sermos felizes. E havia felicidade no rosto do Zacarias. Quando o visitei no dia seguinte vi logo a exiguidade da pequena palhota e as fracas condições. Ele olhava-me de soslaio a estudar as minhas reacções. Disse-lhe:
- Vai ser muito bom!
Espanto, espanto, espanto na cara dele e do padrinho. A menina devia estar louca…
- Vamos fazer assim, como está muito calor e bom tempo pomos a mesa aqui fora debaixo destas sombras bem boas. Eu trago as toalhas que têm de ser branquinhas e o Zé Manuel vai ao Refeba alugar a loiça e os talheres, é a sua prenda.
E o padrinho acrescentava:
- Também posso trazer o vinho e as laranjadas.
Mas o Zacarias ainda tinha uma última questão a pôr:
- E o que faço de almoço?
- Isso é que não custa mesmo nada. Tem tudo à volta da sua casa.
E olhava a pequena horta, farta e bem cuidada e os galináceos que andavam por ali à solta debicando tudo o que encontravam:
- Galinha assada à cafreal, arroz de coco e salada de alface com tomate, quer melhor?
Sorriu, num sorriso que tocava a sinos de catedrais submersas nas suas necessidades.
- Então, posso convidar o senhor padre? - perguntou a medo.
- Pode e deve!
Explosão total. Ia ter uma festa em grande na sua casa, como toda a gente.
Foi um dia lindo Zacarias! Estava tudo tão bonito… A pequena Esperança dormiu a sesta no meu colo, embalada pela aragem que passava pelas velhas árvores onde ela cresceria e se faria mulher.
Não pude acompanhar todo o seu crescimento, você sabe Zacarias… a história, os tempos, a distância… mas não deixei de ser a sua “comadra” e muito menos a madrinha da pequena Esperança. E quando as notícias me chegaram assim de chofre uma atrás da outra, eu pensei que a vida tinha sido injusta consigo, Zacarias: ”Não sei se sabes, morreu o Zacarias e também a tua afilhada ao dar à luz um filho”. Parei diante desta memória. Já passaram uns anos sobre esta notícia mas é sempre como se a tivesse recebido hoje. Num minuto descubro que passou uma vida e na lucidez deste momento penso que algumas vezes vivi a correr. Queria ser apenas a água de um rio que corre lentamente por entre lírios e ser, de vez em quando, uma ave que abre asas e num instante encontra o sabor dos dias que passaram. Para tudo é preciso tempo. Mas às vezes descobrimos, se calhar demasiado tarde, que houve um tempo em que esquecemos as causas que nos confiaram. Zacarias, não é chuva que cai nesta sua última carta… são lágrimas de quem podia ter feito mais e não fez! Um dia, Zacarias, havemo-nos de encontrar, sem preocupações do sítio onde vai ser a festa e qual a ementa que havemos de escolher. Certamente nesse dia descobriremos que afinal fomos fiéis à amizade, à alegria daquele dia em que a Esperança se baptizou, ao abraço da despedida e acredito então que haverá outro tempo para nós no qual colheremos todos os sonhos semeados, como as margaridas da caixa que fecho neste momento.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Foi Há Mais de Meio Século… (II)


E continua a saga… pelas recordações, pelos tempos, pelas caras e, afinal, pelos locais onde passaram tantas gerações. Fotos oferecidas igualmente pelo Fernando Xavier Martins. Nandito, nestas não há dicas tuas, vamos a ver se a minha memória consegue ir ainda um pouco mais atrás.


1 - Aqui quantas vezes não nos juntamos? Para ver nadar os craques ou para nos refrescarmos nos dias quentes do Chuabo ou ainda para irmos aos treinos com o inesquecível Passeti.
Zeca Santos, Joca Campos, Rui Isaías, Fernando, António Pedro Queirós.
De joelhos: Jorge, Chico “Saguim” e ??.


2 - Não dá para ver qual é a rua… Mas seria talvez a rua D. Luís Filipe, onde tu moravas, Fernando. E que trio! Fernando, Rui Isaías e Queirós. As inseparáveis bicicletas! Era assim que vocês conquistavam as miúdas… E elas iam na onda, claro!


3 - Mas quem é que nas férias (e não só) não pegava na “ginga” e ia dar um passeio até ao velho aeroporto? Não consigo vislumbrar bem as vossas caras, mas devia ser o grupo de costume, com alguns “acrescentos”.


4 - Novamente no aeroporto, possivelmente e despedirem-se do senhor que não sei quem é…
Também aqui, há alguns que não me lembro o nome…Respigo os que conheço: “Saguim”, Jorge, Isaías, Raul Vieira Eduardo Cordeiro (lindo de calções), João Carlos, Fernando, ?? , Queirós e ??.


5 - Esta é ainda na piscina Municipal: Saguim, Sérgio Azevedo, Ana Maria Queirós, Anica (será?). De joelhos: Queirós, Fernando e ??.


6 - E sempre a febre do futebol Daqui recordo o Leonel, Fernando, Cordeiro, Gentil, Toninho Victor e…e…e. Fico à espera que alguém complete a legenda.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Uma História A Treze De Maio


Havia um rei que tinha um secretário muito devoto de Nossa Senhora e que, constantemente, exortava o rei a ter fé e confiança na Virgem Maria. Dizia-lhe: Ela é mãe de Deus e nossa mãe e tudo o que lhe pedirmos com amor nos fará! Confiemos-lhe as nossas vidas!

Um dia o rei foi à caça e levou o seu secretário. Por azar foram atacados por um leão que se atirou ao rei e lhe comeu um dedo. Talvez o resultado não tivesse sido pior porque o secretário esbracejava, gritando: tenha calma Nossa Senhora vai-nos ajudar. O leão contente com o pitéu pôs-se em fuga. Regressados ao palácio, o rei, furioso, mandou o seu secretário para a prisão mais escura que havia, protestando: Afinal a tua fé não nos valeu de nada!
Passados uns tempos, sentindo-se o rei melhor, resolveu voltar à caça, seu grande vício. Embrenhou-se na floresta e foi-se distanciando. De repente ouve uma enorme gritaria com palavras que não entendia e uma quantidade de setas cruzavam-se por cima da sua cabeça. Foi apanhado. Tratava-se de uma tribo de índios canibais que estavam felizes com o jantar que iam ter. Puseram água a ferver numa grande panela e, quando se dispunham a meter no caldeirão o apetitoso rei, o chefe da tribo, atento a tudo, disse aos súbditos: Não, não. Este não serve, falta-lhe um dedo. Mandai-o embora.
O rei feliz por ter escapado a terminar a sua vida na barriga dos índios, mandou chamar o seu secretário e disse-lhe: Afinal Nossa Senhora ajuda mesmo quando lhe pedimos e foi o que eu fiz. Agora tu, tanta fé, tanta fé e foste parar a uma prisão…
-Precisamente, majestade, é que se eu não estivesse na prisão teria ido convosco e a mim não me falta nenhum dedo!

terça-feira, 12 de maio de 2009

Querida Mizé


Foi com imensa alegria que li o teu comentário no primeiro apelo que fiz aos ex-CNA e amigos em geral da Zambézia. Lentamente as peças do xadrez vão aparecendo. Como te recordo querida amiga! Foram tantos os momentos bons que passamos juntas... Como é que de Vila Junqueiro se passa para o Canadá? Realmente é como tu dizes: a vida dá muitas voltas! Não me deixaste o teu endereço… Espero que um dia destes voltes ao blogue e mo deixes ficar. Sabes o paradeiro da Manuela Alexandre, Zamira, Glória Garcia e tantas e tantos do nosso ano? A Florinda Carvalho está no Maputo. Sabes com quem estiva no princípio do ano? Com o René Trindade que veio apenas de férias e continua a viver em Quelimane. Falámos do nosso tempo do colégio, das partidas impensáveis que fazíamos às Mestras e colegas. Rimo-nos a bom rir… Volta sempre minha querida e fala-me de ti. Beijos Mizé.


segunda-feira, 11 de maio de 2009

Bom Dia Esperança


Não sei se alguma vez já vos aconteceu, num dado momento da vossa estrada, encontrardes uma encruzilhada com várias direcções e sentirem o desânimo cair sobre vós. E agora, por onde sigo? Os projectos que trazíamos à partida parecem não encontrar eco em ninguém. Aquela nostalgia do “ontem” que trago sempre dentro de mim e que me fez pensar neste caminho à procura de amigos, julgo que já não existe nos outros, dissipou-se com o tempo. A saudade não encontra espaço e o silêncio passa por tantas recordações que pus à disposição de todos, numa disponibilidade de coração aberto. Será que a amizade, o tempo para os amigos agoniza impiedosamente? Os ideais foram desmantelados, murcharam pelo sol forte de uma vida difícil e já não há possibilidade daquela unidade que era bonita de se ver e, principalmente, de se sentir. O hoje, com todas as suas vicissitudes de atropelamentos, correrias loucas de sobrevivência, desencontros, tempos sem horas, amarguras, abafou a alegria e o gosto de viver de antigamente? Será que já não vos conheço, amigos de outros tempos? Já não sereis os mesmos? Tudo isto me fez pensar e parei para me organizar. Terei também eu mudado? Perdido a fé nos outros, na vida e em mim? No barco da vida quem deita fora a fé, deita também fora a esperança. Costumo ser optimista mas reconheço que marquei encontro com o desânimo e hoje estou como o tempo, enfarruscado, triste e sem brilho! A moleza tomou conta de mim… mas garanto-vos que ainda não é a capitulação. A esperança há-de voltar e levar-me mais longe ainda. A tarefa é grande, penosa e sacrificada. Não pelo trabalho em si, mas pelas respostas que não chegam. Mas este blogue continua a ser um desafio, uma luta e, ao mesmo tempo, uma responsabilidade. Abri os olhos fechados por algum cansaço, limpei a face por onde escorriam as lágrimas e pus-me de pé! Caía a noite e ouvi rumores de vozes e passos cansados de gente desanimada, cansada, perdida talvez em encruzilhadas, como eu… Olhei a mochila caída a meus pés, tantos sonhos a sair de dentro dela, notas musicais de um outro tempo, de outro céu e de outro mar. A esperança sobrevive sempre que um adulto chora, disse alguém. A noite já vai longa mas vem aí a manhã que fará cantar de novo o meu coração. Quero abrir de novo as janelas da vida e saudar: bom dia esperança! Quem caminha espera e quem espera caminha. Jamais foi proibido agarrarmo-nos a um sonho para seguirmos viagem. O sonho impulsiona-nos para a vida. Amanhã, quero sorrir e sonhar, sonhar sempre. E se eles se desfolharem silenciosamente, ao menos ficarei com a esperança. Com essa flor que quero trazer sempre nos cabelos a lembrar-me que resistir é viver e desistir é morrer; farei caminho ao encontro dos outros, da alegria e da vida. As noites servem para isto: para encontrarmos, por entre as estrelas, o nosso rumo.

domingo, 10 de maio de 2009

Os Nossos Domingos (III)


Enquanto a praia do Zalala não passou a ser a coqueluche da moda, a juventude (e não só) frequentava a do Mundimo pela simples razão de ser muito, mas mesmo muito, mais perto da cidade: apenas 17Km. A estrada não era grande coisa mas, serpenteada pelo palmar e cajueiros, tornava-se deliciosa e cheia de perfumes do caju às mangas maduras. Na Feira da Madal fazíamos a nossa primeira paragem para nos abastecermos de bebidas numa das lojas existentes naquele lugarejo. Depois seguíamos pela estrada particular da companhia, bem cuidada e apetecível, não só por esse motivo mas também para comprarmos castanha de caju e o seu fruto e ainda grandes mangas suculentas que a garotada negra vendia, por uma tuta-e-meia, nas antigas latas de gasolina ou nos habituais “tarragos” feitos de folha de palmeira. Por mais de um quilómetro os cajueiros bordavam a estrada dos dois lados, carregadinhos do fruto vermelhinho e perfumado, enquanto as abelhas se deliciavam em autênticos banquetes. Quando retomávamos a estrada oficial o trajecto já era curto e os buracos menos sentidos. Passávamos pela “estação” comercial do Mundimo, contornando a casa onde passei férias maravilhosas na minha infância, e descíamos em linha recta até á praia. O barulho do mar chegava depressa aos nossos ouvidos e aquela linha azul e quente do Índico parecia-nos o paraíso.

Passeando pelo extenso areal, a perder de vista, depois do primeiro banho da manhã:

Neves, Detinha Salgado Freire, Jojó, Felisbela Borges, José Augusto, Bébe Salgado Freire, Maximiano Santos Melo, Betty Antunes e Mário Augusto Salgado Freire que nos deixou saudosamente o ano passado.

Aqui, apenas o fotógrafo foi substituído: saiu o José Augusto e entrou o Vasco Malheiro.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

O “Meu” Café


Gosto do meu núcleo do café! Talvez não sejam amigos… apenas conhecidos e companheiros já de muitas horas. Partilhamos pedaços das nossas vidas, as notícias do dia, a carestia da vida, a famigerada crise e até futebol! Gosto destes momentos e preciso deles. Tenho uma mesa “cativa” de onde vejo o mar, onde, por respeito, já quase ninguém se senta. Aí escrevo muitas vezes, leio e até rezo! Sim, porque Ele está sempre comigo e vejo-O muitas vezes à minha frente tomando café comigo, intervindo num silêncio que às vezes me incomoda. Tenho receio que o oiçam quando me chama à razão: ” Não devias ter dito aquilo, não rias tão alto, olha a tua atitude…” E não é que às vezes tem razão? Que raiva! Mas não o posso deixar em casa sob pena de me azedar o dia todo. Faria perguntas intermináveis quando eu chegasse. Os meus companheiros de tertúlia não sabem que Ele anda por ali entre as mesas simpáticas do “nosso café”… Talvez as crianças o sintam porque elas esboçam sorrisos de ternura e ficam com o brilhozinho nos olhos como se vissem alguém que já conhecem há muito tempo…


Há quem afirme com desdém que o “tempo do café” não passa de horas perdidas, sem nexo, da novela da coscuvilhice… Como se enganam! Quantas vezes de uma maneira simples, com uma palavra amiga, somos anjos invisíveis uns para os outros. Lembro-me de ter lido, há tempos, num livro qualquer: “Um anjo é alguém que nos faz sentir… GRANDES! Bem-aventurados os que têm a mania de fazer os outros felizes…


Alô Amigos Zambezianos


No próximo dia 30 de Maio, em Lisboa, realiza-se o XIII Convívio de Antigos alunos, professores, funcionários da Escola Comercial e Industrial D. Francisco Barreto de Quelimane. Agradeço o convite que a Comissão me enviou e que de certeza estendeu a todos os zambezianos que moram por este Portugal fora. É uma oportunidade de nos reencontrarmos e matar saudades mas também reavivar amizades (que é o mais importante). Esqueçam a crise e estejam presentes… Talvez seja um bom motivo para mandar embora essa dama tão cinzenta… Afinal, nós já passamos e vencemos muitas crises e estamos aí!
Contactos necessários para saber tudo sobre este Encontro: Jorge Catalão – TM 967528738. Zeca Nunes – TM 914551238. Armanda Roldão – TM 967009767. A. Simões – TM 919236600.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Casamento em Coalane


Dia 6 de Maio de 1950!

Nesta época ninguém ia a um casamento sem ser de chapéu (as senhoras claro), de vestido comprido e grande toilette. Os homens foram sempre mais discretos nestas ocasiões. E que dizer dos “quatro rodas”? Grandes máquinas!


Casava-se a Olívia Freire com o Nelson Ubach Respeita. Famílias muito conhecidas em Quelimane. Ao lado da noiva, sua irmã e madrinha, a Arminda que, anos mais tarde casou com o Paulino André Moreira. Perfilado e pronto a abrir a porta do Cadillac à noiva, estava o irmão e padrinho, o Alfredo. Atrás, o menino das alianças (o meu irmão) a Lurdes Gomes e eu - andaria por ali nos meus seis anitos irrequietos. Juntamente com a Lurdes éramos as caudatárias. A família Freire vivia nessa altura ao lado da Câmara, numa pequena casita que juntamente com outra no outro extremo da Câmara, formava um conjunto curioso. Lembravam a casa feudal, grandiosa e importante com os seus dois “anexos”. No primeiro, funcionou durante muitos anos a Polícia. No segundo, julgo que estava destinado a funcionários da edilidade porque, posteriormente, foi também habitada pelo Guilhermino Gonçalves, Bibliotecário camarário, e sua família. A família Freire foi sempre visita da nossa casa e velhos amigos dos meus pais. Por isso não foi estranho que, na véspera da boda, a minha mãe e muitas outras amigas fossem para casa da noiva a ajudar na confecção de bolos e não só. Apesar da minha pouca idade recordo-me deliciada os odores adocicados que enchiam a casa toda. No chão de uma sala foram colocados grandes lençóis que iam sendo literalmente tapados à medida que os bolos saiam das mãos das artistas. Deitada entre a infindável doçaria, não sei se pensaria num dia assim, só meu, no futuro ainda longínquo, ou se estaria já a pensar qual seria o primeiro bolo a que eu deitaria mão no dia seguinte… Vou mais por esta última hipótese!


domingo, 3 de maio de 2009

3 De Maio de 2009 - Dia da Mãe


Não sei bem quando foi, mãe. Apenas sei que havia um caminho, o céu, tu e eu.


Íamos andando silenciosamente pelo caminho liso, e nascia do ar uma música levezinha, feita do calmo encanto do vento sobre os campos. À nossa beira nasciam papoilas sorrindo. Vinha ter connosco o perfume branco e agreste que fugia dos campos escondidos, e, dentro de mim, deslizava um grande mar de emoção. E então, minha Mãe, então eu descobri em ti o sorriso trémulo da papoila mais leve e amarrotada pela música do vento. Então eu fui pelos caminhos lisos e desfeitos dos teus cabelos soltos, em busca da tal papoila contente que eu encontrara em ti.

E quando o sol deixou tombar os olhos cansados, de mansinho, eu descobri que a cada amanhecer dos teus olhos havia também um poente, mãe. E quando no pressentimento da noite, a luz quieta e pura veio descansar a sua claridade no silêncio triste do entardecer, então eu descobri o brilho fugidio e doce da tarde no teu olhar, a força pura das árvores solitárias nos teus gestos e a pureza calma dos lagos anoitecidos no teu coração.

Depois, mãe, quando a noite era já profunda e calma sobre nós, eu peguei na música do vento e no meu sonho e fiz daí um hino comovido ao mistério simples que nos une. E no fim, quando as estrelas vieram chorar os seus desejos brandos sobre o mundo, eu sentei-me junto de ti, encostei a cabeça aos teus joelhos e na paz doce da tua presença, na noite, eu chorei com as estrelas, feliz só de me lembrar que te tinha…