sábado, 24 de setembro de 2011

É Nossa!

Era um Agosto demasiado quente e a estiagem tornava a irradiação mais intensa e a natureza um pouco murcha. Telefonaram-me a comunicar o falecimento do pai da senhora doutora, muito vip-vip, e como estava muito pessoal de férias era necessário que eu fosse representar os serviços e avisasse o maior número de colegas vip da vip. O calor do meio-dia amolecia-me sem apetecer sair do ar condicionado. E aonde é que eu iria buscar flores àquela hora? Lembrava-me da recomendação: uma coroa grande e bonita, não olhe a preços… As considerações que estas circunstâncias me pudessem sugerir não me impediram que fosse cumprir o meu “dever”. Calcorreei todos os lugares onde pudesse encontrar algo a condizer com a categoria do finado. Consegui muitos e variados verdes, a exuberância da natureza em Quelimane nunca faltou, mas poucas flores. Ainda assim, com o entrançado da larga fita em dois tons, a coroa ficou cinco estrelas. Quando cheguei à Igreja, havia dois funerais, isto é, dois velórios. Um não tinha ninguém à volta e apenas uns raminhos a tombar com o calor faziam “guarda de honra”. Do outro lado, o defunto tivera melhor sorte (se bem que eu pensasse que ele se estaria borrifando para tudo aquilo) muita gente a chorar, com ramos de muita boa qualidade sim, porque tudo isso pesa na classificação a atribuir a cada funeral: classe A, B, C e os normais. Pesadas e pensadas estas conjecturas, não duvidei mais: o pai da dita senhora era aquele que levava um jardim atrás de si. Com algum esforço peguei na grande coroa e depositei-a aos pés da urna sob o olhar desconfiado das pessoas presentes. Fiz de conta que não era comigo. Baixei a cabeça numa ligeira oração e saí para apanhar fresco e esperar pela vip-vip para lhe apresentar as condolências em nome do serviço. Chegou mais fresca que eu. “Sabe, fomos descansar um pouco, tem estado muito calor”. A quem o dizia…. Mas qual não é o meu espanto quando ela, o marido e mais alguns elementos da família se dirigem para o triste abandonado… Caiu-me a alma aos pés. E as flores? E a coroa? O que é que eu faço? Como o vento da monção rodopiei rapidamente para a direita onde o funeral estava prestes a sair.”Dá-me licença, por favor deixe-me passar”. Reconheceram-me: aquela que tinha posto a grande coroa aos pés do seu familiar. Abriram caminho. Peguei na coroa calmamente e retomei a cantilena: desculpe-me. Dá-me licença? Senti dezenas de pares de olhos em cima de mim. Não tinha outra saída... Com um ar pesaroso fui colocá-la aos pés a quem estava destinada. A vip-vip olhou-me agradecida e sorriu: “Eu sabia que vocês não se esqueciam”.


Fiz um esgar e recolhi-me ao banco mais escondido. O tropel do lado aumentava e eu já via os familiares do outro entrarem por ali dentro e apontarem-me: Foi a menina que roubou as flores do nosso querido… A cabeça zumbia-me e sentia os pés pregados ao chão. A doutora perguntou-me: “Quer vir connosco?” Entrei em pânico. Não, muito obrigado ainda tenho de passar pelos serviços. Imaginava já a contenda que seria no cemitério cada um a puxar pela coroa e todos a gritar: “é nossa, é nossa”!


Nota: Não é história, aconteceu mesmo!

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Vem aí o Outono


Vem aí o Outono, e, para mim, esta é a mais bonita estação do ano. Já repararam como o doirado/acastanhado ou avermelhado da paisagem parece ser um esforço da Natureza a guardar dentro de si, por mais tempo ainda, a magia do Sol ? Os campos tornam-se calmos depois das colheitas diversas e abundantes - cumpriram a sua obrigação! Preparam-se para o descanso merecido. Cada vez mais entendo que também nós vivemos, na vida, as quatro estações do ano! Muitos de nós começam já a viver o outono da vida (afinal, a estação do ano que eu mais gosto…). Melancolia do outono? Porquê? Se o amarelado da paisagem é sinal de tanto que se deu à vida! Não temos o direito de ficarmos tristes - há ainda muita estrada para percorrer e talvez a visão sobre a vida seja muito mais afoita e determinada.
Há tempos, num livrinho de bolso intitulado “Felicidade”, encontrei um pensamento lindo no qual encaixei maravilhosamente o outono da nossa vida!
Era assim: “É só quando já não temos receio, que começamos a viver cada experiência, seja ela dolorosa ou feliz; A viver em gratidão por cada momento, a viver em plenitude.” Viver em plenitude, é isso que é importante, mesmo que já estejemos aposentados profissionalmente. Mas não… aposentados da vida.


Somos jovens ainda, basta acreditar, tão simples como isso. Mesmo no outono da vida, pode ser ainda cedo para conhecermos em toda a sua medida aquilo que Deus ainda nos reserva. Cabe-nos hoje cumprir em alegria e simplicidade, a parcela que nos é dado viver: O dia de hoje… A vida só engana aqueles que não esperam nada dela!
Espigas fartas… Folhas caídas! Deixá-lo… A esperança é dom de Deus em cada dia.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

A Cozinha da Palhota


Alguém pensaria que uma palhota, por mais simples e humilde que fosse, não tivesse uma cozinha? Desenganem-se amigos! No interior da Zambézia, com três pedras, uma panela de ferro e um bom lume e algo para se meter dentro, teríamos um petisco de se lamber os dedos…
Mas a palhota do Zambeziana tem uma cozinha não muito moderna mas funcional onde, de vez em quando, eu cozinho os pratos da minha terra e de todo o Moçambique.


As refeições na Zambézia eram sagradas e duravam horas para degustar uma dúzia de pratos que desfilavam até ao cair da noite, misturados com boas conversas e muitas gargalhadas.
O Índico generoso fornecia-nos bom e variado marisco e suculentos peixes! A terra dava-nos o resto: carne de caça ou caseira. Da velha rota das Índias chegavam-nos os condimentos…
Os meus pais tinham um palmar, ali para os lados da Sagrada Família, com fartas clareiras e algumas palhotas indígenas que compunham o cenário africano. Os leques das palmeiras desgrenhadas abanavam-se dengosos num ventinho por demais delicioso.
Mas delicioso era o cheirinho depois de se destapar as panelas… Mesa rústica, cedida por um dos moradores locais, estendida a toalha, estavam reunidas as condições para um domingo fabuloso e… apetitoso!
O que comemos?
Ora tomem nota:

CHACUTI
Para uma galinha ou pato: primeiro faz-se um refogado – duas colheres de cominhos em pó; duas colheres (sopa) de coentros; três ou quatro paus de canela; seis ou sete cravinhos; duas ou três cebolas grandes; vinagre, azeite, coco, gengibre, canela e muito alho picado.
Depois da galinha, ou pato, limpos, cortam-se aos bocados. Dá-se uma fervura com alho picado, sal e piripiri. Não é preciso cozer muito.
Em azeite quente refoga-se: a cebola, alho picado, canela, cravinho, cominhos, coentros e gengibre até ficar bem refogado, Deita-se o coco, que depois de ralado, foi torrado e pilado. Por último, a carne. No fim deita-se um pouco de vinagre a gosto.
Acompanha com arroz branco ou arroz de coco
O nosso, foi também acompanhado com:


MUCUANE
Cozem-se folhas de nabiça, mandioca ou abóbora, com sal. Depois escorre-se a água e deita-se cebola picada, leite grosso de coco, tomate e piripiri Coze-se e depois de pronto deita-se sumo de limão, de preferência do pequenino.



PUDIM DE CÔCO
Ingredientes:
350grs de açúcar, 350grs de coco, 7,5dl de água, 8 gemas de ovos, 2 claras de ovos, baunilha.
Modo de fazer: Põe-se o açúcar ao lume num tacho com metade do seu peso de água. Logo que esteja em ponto pérola, retira-se do lume. Adiciona-se o leite de coco (meio litro) e um pouco de baunilha, arrefece e misturam-se as gemas e as claras levemente batidas com um garfo.
Deita-se numa forma untada com manteiga. Vai ao forno a cozer em banho-maria.


BOM APETITE e que passem um domingo tão feliz como nós passamos.