terça-feira, 13 de março de 2018

De Tempos a Tempos o Tempo

É pela calada da noite que as minhas lembranças tocam mais depressa o meu coração. No momento em que escrevo não sei que horas são mas sei que passa muito, mas mesmo muito, da meia noite. No silêncio que me envolve sinto as ondas da vida na minha consciência, falando, contando coisas. E quem consegue fugir a esta confissão? Há tantos monólogos guardados dentro de mim que, agora, como uma bolha, assumem ao terraço da minha alma.
Os meus amigos dizem-me que na minha mente não há espaço para mais nada, está repleta de lembranças, histórias e nomes. E é verdade! Eu lembro-me da mãe da Lurdes; a padeira de aljubarrota como lhe chamávamos pelo seu físico estrondosamente redondodo e voz cavernosa com que chamava pelas crianças que brincavam no pátio.
- Crianças, vocês não têm casa?
E era ver quem se escapulia primeiro...
 

E a Dona Irene, uma velhota de quase oitenta anos que não perdia uma única sessão de cinema da noite. O vizinho, dono de um cinema, oferecia-lhe essa “gulodice”.
- Dona Irene, de qual filme gostou mais esta semana?
- Ah, de todos, de todos. E a criançada ria.
As recordações chegam às catadupas, como se estivessem apontadas em inúmeros cadernos numa projecção incansável.
- Os tempos não passam para ti...
Passam, passam... Tu é que passas pelos tempos sem reparar neles.
- Lembras-te dos dias sublimes e longínquos da tua infância? O que de ti ficará quando tudo passar?
No tricot da vida ficam os pontos perfeitos em que buscamos a liberdade de nos descobrirmos como éramos. Caso contrário, será dificil descobrir-mo-nos plenamente, livres autênticos como dantes.



Sei que esta noite mais memórias chegarão, algumas com armadilhas inevitáveis e outras com uma ementa que não saberei por onde começar.