domingo, 19 de julho de 2009

Carta Aberta


Hoje é o dia do teu aniversário, parabéns Mãezinha! Já reparaste que conjugo o verbo no presente… porque não há pessoa mais presente na minha vida do que tu!

Não quero que seja apenas mais um aniversário. A azáfama de anos passados não é a mesma, é certo, mas há emoções que não se esquecem e enfeitam na mesma este dia.
Como gostavas de festejar a vida! Terei herdado isso de ti? Talvez… Nunca nos importamos de fazer anos e muito menos de os festejar. Como recordo a tua ansiedade, era difícil retê-la! Parecias uma criança… Na véspera convidávamos-te disfarçadamente a deitares-te mais cedo. Convinha aos nossos planos. Tu fazias de conta que não entendias nada e prolongavas o nosso suplício.
- O quê, deitar-me tão cedo? Está uma noite tão bonita e está-se bem aqui na varanda…
Entrávamos em desespero. Não podíamos dizer-te que precisávamos de tempo e espaço para os preparativos. Acredito que por dentro tu soltavas gargalhadas face à nossa aflição. Por fim, talvez com pena de tanto sofrimento, lá ias dizendo:
- Têm razão, está a ficar um pouco tarde, vou deitar-me!
Lentamente, para moer a nossa paciência, ias à casa de banho, à cozinha buscar um copo de água e nós atrás em procissão cautelosa… De repente voltavas atrás quase atropelando-nos…
- Será que o tabuleiro da carne para assar ficou tapado?
Subíamos pelas paredes… Finalmente a porta do teu quarto fechava-se. Ficávamos à escuta até deixarmos de ouvir o último ruído. Dávamos mais algum tempo porque contigo nunca sabíamos….
- É agora! – Corríamos aos nossos quartos e de debaixo das camas tirávamos montes de embrulhos feitos com inúmeros malabarismos para mantermos a onda do secreto.
Colocávamos tudo à porta do teu quarto, do lado de fora, deixando apenas um pequeno espaço para que pudesses abrir a mesma no dia seguinte. Nunca soube se conseguias dormir nessas noites… Nós passávamos apenas pelo sono, ansiosos que fosse dia. Eras o galo da casa. Mal o primeiro raio de sol entrasse pela janela do teu quarto, já tu sacudias os lençóis para trás e vestias o roupão. Ouvíamos então um barulho e a tua voz feliz a dizer:
- Mas o que é isto? Puseram aqui uma loja? - Surgíamos a seguir cantando e com ramos de flores nas mãos. Era o alvoroço total. A partir daí o telefone não parava de tocar, as prendas iam chegando ao longo do dia trazidas pelos empregados das tuas amigas. Houve um ano que chegaste a ter quatro bolos de aniversário. Lembras-te? E não é que quiseste apagar as velas de todos eles? Nós já não tínhamos fôlego para tanta cantoria… Um grupo de amigos trouxe para o jantar de festa uma caixa enorme com mais de um metro de altura, embrulhada a preceito e com uma grande etiqueta: “FRÁGIL!” Levaste mais de uma hora a desembrulhá-la porque dentro, havia outras caixas, sucessivamente mais pequenas, para desembrulhar… uma, duas, três, quatro, cinco… e por aí fora até a uma minúscula caixa que não teria mais de dez centímetros:
- Cuidado, aí é que está a jóia… - Avisavam!
Nova expectativa e zás… sai de lá de dentro uma pequena chupeta com um lacinho cor-de-rosa! Gargalhada geral.
Quando te ias deitar, cansada mas feliz, dizias:
- Que pena ter acabado!
- Deixa lá Mãe, para o ano há mais…
Mãezinha já te deixei as flores que tu gostas no lugar que sabes, mas é no meu coração que hoje festejo o teu aniversário. Caminho até à minha juventude para te encontrar e vejo-te de tantas maneiras… Contigo aprendi o que era coragem, aprendi a lutar no meio das maiores dificuldades, aprendi a aceitar o sofrimento generosamente… Tu foste, tu és, aquela árvore frondosa que nunca me negou apoio e o colo para eu chorar… Tantas vezes a borrasca caiu sobre a nossa casa mas tu arrastavas-nos para o sol através dela. Tanta cumplicidade entre nós, tantos projectos sonhados a meias… Obrigado pelo teu amor, pela tua fé na vida. Obrigada sobretudo pelo teu testemunho de ânimo e força. Afinal, as árvores morrem de pé!
Parabéns Mãezinha!

7 comentários:

  1. O mar defacto é um fascínio muito grande para quem com ele conviveu e o adora.

    Foram quase 60 dias que nele naveguei pelo Atlântico e Índico a caminho de Moçambique e no regresso a este país.

    Isto deixa saudades na mente de uma pessoa bem como o tempo passado naquela terra onde recordar é viver tudo o que lá vivi.

    Desde Porto Amélia, Moeda, fronteira com Tanganica o Rio Rovuma bem como o Lago Niassa,
    locais altamente perigosos e com uma guerra em pleno se vivia momentos de grande terror.

    São coisas que nunca mais se poderão esquecer porque a memória não apaga.

    E tudo de tanto se passou, para que de nada serviu a quem teve que lutar por uma causa que se pode dizer (sem nome).

    Resta a saudade dos bons momentos lá passados para afagar os muito maus momentos.

    Esta Carta Aberta está muito linda onde revela o amor por quem nos pôs no mundo.

    Num sublime descrever de coisas passadas, se pode sentir e recordar tempos felizes que passaram por nossas vidas.

    Bjos, bom Domingo..

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  2. Um excelente fim-de-semana, se possível, diferente!

    ASS: Diferente

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  3. "E tu, sozinho e pensativo na tua dor, procurarás a tua mãe, e nestes braços esconderás o teu rosto; no seio que nunca muda terás repouso "

    Abraço.

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  4. Conheci a sua mãe que era amiga da minha tia que era do Apostolado. É assim a vida! Monhé

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  5. Olá Monhé
    Fiquei contente por ter conhecido a minha mãe! Eu tb era do A.O. e de certeza que conheço a sua tia. Diga-me o nome dela a ver se chego a si. Um abraço Graça

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  6. OLÁ GRAÇA
    GOSTEI DE REVER A NOSSA QUELIMANE E LUABO, ONDE VIVI.HOJE VEIO PARAR-ME AO MEU PC O TEU BLOGUE E GOSTEI MUITO.
    DE CERTEZA QUE O ANTÓNIO PEDRO SE RECORDARIA MELHOR, MAS COMO DEVESSABER ELE "PARTIU"´HÁ ANO E MEIO. MAS ESTÁ PRESENTE...
    BEIJOCAS
    GRAÇA QUEIROZ

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  7. Graça, vim retribuir e agradecer a visita ao meu "palco"... e perdi-me um pouco pela leitura dos teus posts... deve ser verdade, sim, a fada que nos visitou deixou-nos esse amor às palavras. Vou voltar.

    Um beijo meu, Graça, desta Graça :)

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