segunda-feira, 13 de abril de 2009

Foi há mais de meio século… (I)


Hoje fiquei comigo. Hoje fiquei com a minha alma e os meus pensamentos. Por vezes, gosto de ficar assim – abrindo e fechando as portas e janelas das minhas certezas ou incertezas, das minhas recordações espalhadas pela estrada que já caminhei. Como se faz no computador: clicando aqui e acolá à procura de coisas. Hoje dir-se-ia a pesquisar… Mas não! O que hoje fiz foi reconstruir um tempo que já passou pela ampulheta. Antigamente, a areia levava o seu tempo a escorrer mas, à medida que os grãozinhos vão sendo menos, ela esgueira-se que nem uma enguia nas mãos do pescador. Por isso, hoje fiquei comigo, relembrando tempos de menina, companheiros e amigos da minha infância e juventude, os velhos lugares dos acontecimentos, a Casa, a Escola, o Colégio, as professoras, as ruas, as praias… E não se pense que é tempo perdido. Quem assim julga, engana-se! Todas a vezes que recuo é para avançar sempre. Nestes passeios que dou comigo faço uma espécie de contabilidade. Levo pois uma pequena balança e vou colocando nos pratos as alegrias e desilusões. É também um modo de me conhecer melhor. Analisar as minhas reacções e capacidades perante ondas diferentes do tempo. Antigamente não havia os GPS e talvez fosse mais difícil avançar por caminhos desconhecidos e perigosos. Mas constato que isso não é verdade. Talvez fosse da limpidez do firmamento, da vontade de avançar, de descobrir ou da harmonia entre os meus pensamentos e atitudes, não sei… A verdade é que houve um tempo que foi muito mais fácil de percorrer. Vivo então uma espécie de encantamento neste encontro comigo e com a vida. É como se andasse de comboio e saísse numa estação qualquer… ao acaso!

Tinha onze anos e pisava pela primeira vez os degraus do colégio. Era uma caloira, em tudo. Olhava os veteranos com respeito e admiração. Eram para nós, os caloiros, os nossos pequenos ídolos. Havia craques em todas as áreas: na natação (o João Godinho e a Regina Veloso, atletas olímpicos), no futebol (o Carlos Serrano) no basquetebol – loucura, loucura – (Rui Isaías, Leonel Costa, Juca, Queirós, César, Fernando… e tantos outros) no teatro, na música… nós ficávamos permanentemente deliciados. Éramos a geração a seguir e respiramos esta alegria verde na partilha da vida. Bebíamos a luz e as tonalidades com que eles pintavam os caminhos e íamos a seu lado, paralelamente, descobrindo o sabor das horas. Foi bom ter crescido com a geração dos anos cinquenta! Hoje, que estive comigo, descobri que toda a força das ondas do mar, dos ventos, a grandeza do céu azul nas tardes de desporto, de teatro, de poesia, moldou a minha alma, a minha maneira de ser. Há encontros que traçam uma rota, que fazem estremecer de emoção. Hoje, que decidi ficar comigo neste remexer de lembranças, as respostas foram chegando: a cada momento, a cada presente, só é possível construí-los com o material que trouxemos do passado. E é com o momento de hoje que eu construirei o futuro. Há ainda um caminho a percorrer… Longo, curto, não sei! A única coisa que sei, é que será com estes mesmos valores que eu continuarei a minha caminhada. Hoje que resolvi ficar comigo, vi bem o quanto andei e a dimensão exacta da minha verdade interior. Devagar, devagarinho, fecho a gaveta e, de novo, estou na estrada… até ao fim.


O basquetebol era mesmo uma paixão no colégio, implementada, julgo eu, pela querida Madre Albert que dos seus dois metros de altura começou a treinar esta modalidade muito praticada nos Estados Unidos, seu país de origem. Lembro-me dela arregaçando as saias compridas, mostrando os collants brancos e gritando com a equipa. Do colégio este desporto estendeu-se por toda a cidade.


Por detrás desta foto reza assim: “Ganhámos 20-8”. Penso que teria sido à Escola Técnica, nossos eternos rivais… Leonel Costa, Rui Isaías, Fernando Xavier Martins (de pé). Em baixo: António Pedro Queirós, Camacho e o Dédé.


Os campeões de 1955/56. Havia uma música feita propositadamente para as falanges de apoio cantarem, contra os rivais!

2º Campeonato de basquetebol do colégio, 1956. Aqui, três elementos diferentes do ano anterior: Zeca Santos, César e Victor Xavier Martins.


Não era só de desporto que vivia a geração 50! E as festas? Aqui, já havia alguma mistura com os caloiros, possivelmente irmãos dos veteranos… Tanta gente conhecida!!! Penso que o palco do evento foi o ringue do Benfica (ou será que foi o do Sporting?).


O Fernando Xavier Martins (discursando!?! O quê?). Ao lado, da esquerda para a direita: Luís António, Cordeiro, Pedro Gouveia e Melo, Fernando, e Chico “Saguim”. Por detrás vêm-se as caras da Helena Silva e Ana Rita. À frente a “pequena” Detinha Salgado Freire.

Nota: Todas estas fotos foram-me oferecidas pelo Fernando Xavier Martins. Um querido!

3 comentários:

  1. Olá, minha amiga feiticeira...

    Nós sentimentais,quando fingimos chorar,choramos....

    POTT

    ResponderEliminar
  2. ..afinal ainda tenho mais algum tempo,,
    Há quanto tempo foi que, pela última vez, paraste e te sentaste e respiraste fundo e fechaste os olhos e folheaste o álbum das tuas imagens? Eu quero dizer aquele álbum a que colaste a etiqueta "Coisas Simples". Já não te lembras.
    É natural. Depois de tantos temporais, de tantas guerras, de tantos relatos em grito sobre essas guerras e esses temporais, como deves estar cansada. Tão cansada que tens medo de parar. Ou vergonha... Não tenhas. Acredita em mim.
    Parar é reconhecer a Vida. Pode acontecer que sintas um leve arrepio. Um estremecimento como se adivinha na relva pela tardinha. Não te assustes. É o sinal de que estás pronta para saborear de novo as pequeninas coisas que havias esquecido.
    Foram elas que fizeram de ti uma mulher grande. E continuam ao teu dispor. E gostam que as revejas, de olhos fechados.
    Com um sorriso doce. Assim mesmo. Assim...

    Desculpe trata-la por tu....apeteceu-me...

    POTT

    ResponderEliminar
  3. Olá Pott

    …a “feiticeira” emocionou-se! As feiticeiras choram? Porque não? Afinal o “carreiro mágico” traz afinidades e o gosto pelas “coisas simples da vida”. O poeta nem sempre fantasia, tem também a sua dimensão humana que o faz partilhar a realidade das coisas, sem esquecer o sonho que o impele sempre. Já dizia Lord Byron: “é preciso partilhar para se ser feliz.”

    O abraço de sempre

    Graça

    ResponderEliminar